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PTSC #15 :: Marco Oliveira

Foto: Rafael Roncato

Autor do blog Overdose homeopática, Marco Oliveira lançou seu primeiro livro em 2013, homônimo ao blog, com uma coletânea de tiras publicadas em sua página, mas também com algumas inéditas. Apesar de tímido – pelo menos é o que ele diz –, suas tiras não são nada encabuladas. Mas explica: “O humor quase sempre vem da tragédia, da desgraça de alguém, da ofensa. (…) Vejo o humor negro, de escárnio, sujo e ácido, como o mais bonito de todos, mas só quando é natural”.

Como todo autor de quadrinhos que se preza, se diz preparado para passar fome fazendo quadrinhos no Brasil: “tanto que minha fome só tem aumentado, junto com minhas contas e credores. Fazer quadrinhos por aqui é justamente isso. Ou faz por amor ou não faz. Pela grana que não será”.

_Quais suas influências nos quadrinhos?
Deixando de lado aqueles de citação obrigatória (Laerte, Angeli e afins), sou influenciado o tempo todo por muita gente. Mesmo que eu não queira, sofro influência quando vejo algum trabalho que me agrada. Eu as incorporo sem nem perceber que fiz isso, percebo quando alguém comenta “o traço me lembra fulano; o humor remete a beltrano” e vejo que é mesmo verdade. E creio que com todo mundo é assim. Não somos plenamente conscientes para escolher o que vamos ou não acrescentar à nossa bagagem artística.

Mas falando do que me atrai e inevitavelmente me influencia: Fernando Gonsales, Adão, Zimbres, Dahmer, Galvão Bertazzi, O quarteto Xula: Coimbra, Maron, Calote e di Chico, Andrício de Souza, Rafael Sica, Salimena, Lafa, e mais uma pancada de nego foda.

_O que acha da discussão do politicamente correto no humor?
Acho que é uma discussão que não vai levar a lugar algum. Sempre vai ter alguém pra chorar em cima de alguma piada, mesmo que se comece a pegar mais leve. O humor quase sempre vem da tragédia, da desgraça de alguém, da ofensa. Nos meus quadrinhos não me preocupo com isso, só procuro ser honesto e passar para o leitor o que quero e tenho a dizer. Esse é meu termômetro. Não acho nada honesto usar aquilo que a sociedade em geral chama de politicamente incorreto como ferramenta para chamar atenção. Pra mim isso é apelação. Até porque, eu, como pessoa física e tímida, não gosto de chamar a atenção, ainda mais dessa maneira. Vejo o humor negro, de escárnio, sujo e ácido, como o mais bonito de todos, mas só quando é natural. Não adianta forçar a barra e apelar com palavrões e ofensas gratuitas. Se alguém faz uma piada sem graça eu não rio e se não gosto do artista simplesmente não acompanho seu trabalho. Enfim, o chororô é tão chato quanto as piadas forçadas. Que a liberdade seja a prioridade. Que sejamos livres para ofender ou tapar os ouvidos.

_No prefácio de seu livro Overdose Homeopática, Andre Dahmer diz que você tem todas as condições para morrer de fome fazendo quadrinhos no Brasil. Como é receber esse “elogio”?
Pra mim o Andre é o quadrinista/tirista mais competente do mercado brasileiro. É o cara que, mesmo tendo que criar num ritmo alucinante (duas tiras diárias, pelo que sei), não erra, não dá nem uma forçadinha na amizade. Toda nova publicação tem a costumaz (primeira vez que uso esta palavra) genialidade. É a mesma regularidade que vejo no Fernando Gonsales e no Galvão Bertazzi.

Receber esse elogio me fez mesmo acreditar que estou pronto pra passar fome fazendo quadrinhos no Brasil, tanto que minha fome só tem aumentado, junto com minhas contas e credores. Fazer quadrinhos por aqui é justamente isso. Ou faz por amor ou não faz. Pela grana que não será.

UM LIVRO

“Uma das maiores ‘Causa mortis’ de tímidos do mundo inteiro, a inanição, na verdade, é uma consequência da cerimônia alimentar, aquela inexplicável vergonha de aceitar a comida alheia. Na concepção do tímido, comer é um ato criminoso e vulgar.

– Aceita um macarrão?
– Não.
– Tem certeza de que não quer sorvete?
– Não.
– Menina, jura que você não está com fome?
– Não, não, não, não não… até desmaiar de fome.

Esse mesmo princípio pode ser aplicado à vergonha de pedir cobertor extra quando um tímido dorme na casa de um amigo. Acorda com os ossos doendo de tão gelados e ainda tem que fingir para a mãe do amigo que teve ‘uma noite muito agradável’.”

Manual de Sobrevivência dos Tímidos
Bruno Maron
Lote 42, 2013

_Você vai lançar um segundo livro em 2014 (Aos cuidados de Rafaela). O primeiro não foi o suficiente para perceber que nesse ritmo pode mesmo morrer de fome?
A gente acaba acostumando com as porradas e até gosta, tipo mulher de malandro, que gosta de apanhar e não cai fora. Esse segundo livro é bem diferente do primeiro, é uma graphic novel (soa importante isso: graphic novel), história longa com roteiro do Marcelo Saravá, grande artista e amigo. Um grande desafio para mim, que sempre trabalhei com ideias e histórias curtas. Tem sido bem difícil, mas muito bom. Sinto como se fosse um cabaço sendo estourado: tá difícil, mas continua que tá bom. O projeto foi contemplado no Proac, e ainda não sabemos se ele sairá por alguma editora ou como independente. Deve ficar pronto dentro de uns dois meses e vai ficar muito bom, pois temos tomado todo o cuidado do mundo pra não sair merda, tanto no roteiro quanto na parte gráfica. Além do segundo, já tenho o embrião de um terceiro (não falei que gosto de me dar mal?), e se trata do Mute, projeto que venho trabalhando há um bom tempo e, embora não tenha data, pretendo publicá-lo ainda este ano. Talvez eu tente um crowdfunding. Talvez não. Vamos ver o que se desenrola nos próximos meses.

_Você fala que não sabe como “aqueles caras” publicavam diariamente tiras no jornal. Então revele o segredo, como faz pra criar as suas?
O segredo é criar sua própria maneira e não seguir o caminho de ninguém. A criação é feita por um mecanismo da mente, uma faculdade que está desativada na maioria das pessoas, mas está lá. Todo mundo pode criar. Antes de dar o start, de começar a criar os quadrinhos, minha mente não estava alerta para criações, não estava programada para perceber as possibilidades, e isso mudou quando eu simplesmente comecei, passei a perceber as possibilidades nas situações cotidianas, como se eu passasse a ter uma antena própria para a captação das ideias que estão no ar, as ideias que qualquer um pode ter. Basicamente é isso, estando aberto às criações, uma ideia pode nascer de um comercial de tv, de um documentário, de uma situação qualquer, de um pornô com anões etc.. Não existe uma fórmula, nem segredo, e mesmo que houvesse um eu jamais divulgaria, já basta dividir com poucos a fome de agora.

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